quarta-feira, 29 de julho de 2009

Eu sei, é apenas cinema nacional, mas eu gosto!

Não! Tô cansada! Só essa semana foram três pessoas que me disseram que não vão ao cinema perder tempo com filme brasileiro. Alugar DVD nem pensar!
Calma aê! Não é por aí, não! Eu fui ao cinema para ver A concepção e não fiquei xingando ninguém. Até hoje não me arrependo. São também experiências “amargas” assim que nos tornam mais sábios e seletivos. Lógico que já caí em outras roubadas do tipo Meu tio matou um cara e A casa da mãe Joana, mas tudo bem. Bosta também é importante para fertilizar o solo.
Tem gente que anda meio desatualizada, né? Achando que ainda estamos na fase pornochanchada. Com Sonia Braga e Vera Fisher mostrando meias palavras e peitos inteiros, textos desnecessários e prolixos. Ou então na safra anos 80 com aquele roteirinho bobo, cenas nonsense e um imenso apelo musical como em Menino do Rio, Garota Dourada ou Beth Balanço. Enfim, mesmo nesses períodos muita coisa boa surgiu e muita coisa boa ainda há de pintar por aí. Eu só não posso falar daquilo que não sei, porque essa não era bem a minha época. Na verdade não era a época de quase ninguém, afinal, por incrível que pareça, a produção nacional era bem menor do que hoje. Aliás, o Brasil tem parido muitas películas interessantes ultimamente e dessa época eu mesma posso citar uns poucos que a galera mal informada podia conferir. Porque não querendo ser falsa patriota e/ou piegas, mas já sendo, temos mesmo que valorizar a nossa cultura e descobrir o nosso potencial. Walter Salles e Fernando Meireles já são internacionais. O Brasil tem muito mais para dar!

O Bicho de Sete Cabeças – Não sei se Rodrigo Santoro deu a perfeição ao filme ou o filme a Santoro. Ambos são impecáveis. Elenco, roteiro, atuação... Tudo no lugar certo! Um filme comovente que foi o primeiro a abrir meus olhos para a competência do cinema nacional.

O ano em que meus pais saíram de férias – Mostra uma época dura da nossa realidade (os tempos de ditadura) aos olhos de uma criança. E, aliás, falando em crianças, o filme traz duas muito talentosas, o protagonista e sua amiga, duas mini-estrelas. Isso deixa o filme doce e leve, apesar da temática triste. Inesquecível!

Chega de saudade – dá para imaginar um filme onde o único cenário é um típico salão de baile, desses tipo terceira idade, com ritmos como bolero, maxixe, forró e canja da Elza Soares e banda? Não dá! Por isso é também inusitado! E mesmo com um elenco de talento duvidoso (Betty Faria, Paulo Vilhena...), porém impecável (neste filme, pelo menos), o filme é muito bom!

Depois daquele baile – Esse só pelo elenco já dá para ver que não é um filmeco qualquer. Lima Duarte, Irene Ravache e Marcos Caruso no melhor estilo “monstros sagrados” pra ninguém botar defeito. Emoção a flor da pele. Uma história para ver e rever e se emocionar sempre. Amor e amizade relatados com toda a poesia que ambos merecem.

Cheiro do ralo – Humor negro, ácido, sarcástico na sua melhor forma. Selton Mello só faz coisa boa, vamos combinar! Mas, nesse caso, sem aquela previsibilidade de O Alto da Compadecida e O coronel e o Lobisomem, aliás, ótimos também. Neste filme ele mostra à que veio. Bom, já tinha mostrado... Agora ele prova mesmo. Daí pra frente é só coisa boa, como Lavoura Arcaica, Meu nome não é Johnny, blá, blá, blá, até parece que dá para citar um só. Selton é selo de qualidade.

Tropa de Elite – Wagner Moura em excelente fase. Uma pitadinha de humor trazida de Deus é brasileiro com um pouco de seriedade e mistério trazidos Caminho das Nuvens. Atuação implacável num roteiro matador. Realidade e ficção bem misturadas ou bem separadas, da forma que o espectador quiser.

Central do Brasil – Este é fraquinho de elenco, traz só a melhor atriz brasileira dos últimos tempos. Quem discorda é porque precisa sair da frente da televisão. O filme é uma linda estória com base na realidade brasileira para brasileiro ver. Ou seja, sem essa de injustiça porque não levou Oscar. Acho que não ia levar de qualquer jeito, mas temos que concordar que concorrer com “La vita è bella” é sacanagem. Esse aí é só a obra-prima de Benigni, devia ter ganho o Oscar de Melhor Filme e ponto. Mas vai falar isso para um americano, né?

Cidade de Deus – Com míseras indicações ao Oscar, este sim, merecia mais. No mínimo, melhor filme estrangeiro, mas paciência. Uma estória tocante sobre um menino que escapa de se tornar um bandido em meio à tanta miséria e violência. Belo roteiro, fotografia, não deixa nada a dever diante de grandes produções hollywoodianas.

Bom, citei só esses aí, mas não por falta de opção. É por falta de tempo mesmo. Fora que é a minha humilde sugestão para quem está pensando em filmes realmente interessantes, que acrescentem alguma coisa, já que se é para ver besteirol estilo americano, nós também temos “Divã”, “Se eu fosse você”, “Fica comigo esta noite” e tantos outros para dar e vender. Porque ver um filme muito bom sem dublagens e legendas, que muitas vezes distorcem o sentido original, com créditos, trilha sonora e tudo mais em português bem brasileiro não tem preço!

sexta-feira, 17 de julho de 2009


Eu realmente gostaria de deixar minhas opiniões sobre esta maravilhosa viagem no tempo que é este livro. Tempos que pouco vivi e outros que muitas vezes desejei ter vivido.
Na verdade, por mais que quatrocentas e poucas páginas sejam aparentemente ridículas para contar estórias dos momentos mais marcantes da nossa música, em sua maioria elas são precisas e recheadas com uma prosa fluida e gostosa que vale cada parágrafo. Eu poderia dizer muito mais, ressaltar o meu desejo por mais esclarecimentos, mais segredos, confidências, detalhes das obras e de artistas que alimentaram e alimentam minha alma com músicas inebriantes e letras comoventes. Mas pesquisando algumas informações sobre este livro acabei por encontrar algo tão estranho que não tenho como não postar. Eis aqui um comentário que é EXATAMENTE a minha opinião, sem tirar nem por. Quer dizer, exceto a parte do amigo que falou que Nelson Mota era oportunista e paspalho. Felizmente eu não tenho nenhum, ia sugerir que ele postasse comentários mais construtivos e embasados. Infelizmente eu não tenho nenhum, meus amigos ultimamente não lêem nada que preste e se lêem, só Deus sabe...

Uma Aula Sobre Cultura Pop
por Marcelo Silva Costa

Um amigo, numa resenha, escreveu que Nelson Motta era oportunista, um paspalho. Outro amigo, numa mesa de bar, me explicou que o problema de Nelson Motta era passar uma imagem de agitador e ser exatamente o contrário, um acomodado. Eu, pessoalmente, não tenho opinião formada sobre a pessoa Nelson Motta. Apenas o conhecia de algumas letras legais em parceria com Lulu Santos e do chatíssimo programa Manhattan Connection. Mesmo assim fui, cético, ler seu livro "Noites Tropicais"... e chapei.
"Noites Tropicais" funciona como uma quase biografia do autor, que conta suas memórias musicais, vividas como jornalista, produtor, compositor, diretor artístico, crítico musical, entre outras funções. Funciona melhor ainda como um diário de turma. Imagine-se contando a história da sua turma, os acontecimentos engraçados, fatos inusitados. O diferencial é que a turma de Nelson Motta tinha personagens com Vinícius de Moraes, João Gilberto, Roberto Carlos, Elis Regina, Rita Lee, e o grande Tim Maia (responsável pelos melhores trechos), além de muitos, mas muitos outros.
É lógico que apenas bons personagens não rendem um bom livro. Se não houver, entre eles, uma ligação, uma história, poderia ser uma bobagem. Mas "Noites Tropicais" não é. A força do livro se concentra, claro, na histórias da bossa nova, em seu confrontamento com a jovem guarda, e nos festivais, febre da nascente indústria da televisão no Brasil.
Na verdade, funciona melhor ainda como um diário dos anos de ditadura. E ganha pontos com isso, ao relacionar música com política. Porque é impossível distanciar algo cultural (seja livro, seja cinema, seja música) do ambiente em que ele foi gerado. Com isso, percebemos que a MPB foi, sim, um retrato inteligente dos anos difíceis pós AI5 e que o breganejo, o axé e o pagode, são o retrato perfeito do Brasil 2000, um país chafurdando em sua própria miséria cultural, e se divertindo com isso. Já foi diferente, e é esse o grande mérito de "Noites Tropicais". Trazer em seu conteúdo, para quem tem menos de 30 anos, histórias já contadas por muita gente, em vários lugares, mas nunca registradas em papel. Sendo assim, podemos perceber o valor de um Chico Buarque, hoje afastado da mídia. Apenas o episódio "Julinho da Adelaide" é tão importante para a música brasileira quanto o Sex Pistols tocando às margens do Tamisa, no Jubileu da Rainha, em 1977, para a música inglesa.
Fora isso, o livro ainda é divertidíssimo. E Tim Maia é personagem central de várias das passagens antológicas do livro. Numa dessas, depois do grande sucesso de "Primavera", que vendeu milhares de discos, Tim foi para Londres e se
esbaldou com tudo (drogas, bebidas, brigas) e voltou com 200 doses de LSD para distribuir aos amigos. Nelson conta que assim que chegou a Philips (sua gravadora), Tim visitou diversos departamentos, começando pelos mais caretas, como a contabilidade e o jurídico, e repetia, sempre o mesmo discurso ao funcionário da repartição: "Isto aqui é um LSD, que vai abrir sua cabeça, melhorar a sua vida, fazer de você uma pessoa feliz. É muito simples: não tem contra-indicações, não provoca dependência e só faz bem. Toma-se assim". Nelson diz que após isso, Tim jogava um ácido na boca e deixava outro na mesa do funcionário (imagina a cara de babaca do cara). Como era o sucesso da gravadora, todo mundo achava graça. E até o presidente da companhia ganhou a sua dose. É mole?
É claro que o livro comete alguns erros, afinal é a versão de uma pessoa sobre a vida de muitas outras. Principalmente quando o assunto é o rock nacional anos 80. Mas é necessário observar que Nelson tinha mesmo que contar a história da
sua turma, da turma dele. O rock nacional é outra turma, é a minha turma, e esse capítulo terá que ser contado por outro. Isso explica erros infantis como trocar uma palavra -importante - na letra de "Inútil" do Ultraje ou achar que o Ira! nunca esteve entre as grandes bandas dos anos 80. Mas é perdoável, afinal não podemos cobrar de um cara que quis aprender violão, para tocar bossa nova (com a sua turma), que ele venha tocar guitarra e sair com a galera dos anos 80 (a nossa).
Esses erros e acertos chamam-se História (com H maiúsculo e dourado, como diria Humberto Gessinger dos Engenheiros do Hawaii). E para aqueles, que como eu, acham que cultura pop devia (quem sabe um dia) ser estudada em escolas, "Noites Tropicais" é obrigatório. É muito mais interessante que física, química ou gramática (como aprovaria Renato Russo). É um retrato antigo de um país inteligente. Um tempo que dificilmente voltará. Um livro para roqueiros (como eu), sambistas, tropicalistas, rappers e sobretudo, um livro para a juventude. Era assim.

Marcelo, 29, é editor do fanzine de cultura pop Scream & Yell.

http://www.screamyell.com.br/literatura/tropicais.htm